quarta-feira, 20 de julho de 2016

Resenha - O que é a psicologia? - Georges Canguilhem



        Pág. 401 - 418:


        Não há uma só resposta do que venha a ser a psicologia, ou seja, são várias.

Ele começa o texto discursando com outro autor que se chama Daniel Lagache (1903-92), psiquiatra e psicanalista francês, e disse que é possível resumir qualquer psicologia como uma teoria geral da conduta, mas Canguilhem não de acordo com essa definição porque ao pensar que estamos todos falando as mesmas coisas não falamos o mesmo. Há diferentes versões na diferença do que é a conduta. Então se inicia de uma ontologia distinta um pressuposto diferente de que mundo ao qual estamos estudando. 

     Para algumas escolas da psicologia o homem tem a mesma conduta de um animal, do que a conduta de um humano; para outros a uma descontinuação da outra. Não é possível definir o estudo da psicologia como o estudo da conduta, porque nem todos os psicólogos estão de acordo em definir que seja somente a conduta. 

      Tentar definir esta ciência como a unidade de seu domínio seria cair em um realismo ingênuo, porque implica crer na realidade que esta aí, ou seja, a realidade como um objeto. Acreditar que o objeto existe independente, que o objeto está dado e será possível estudar criticamente quando ao contrario, a realidade é construída, consensuada acerca deste objeto de estudo. 

         I - A psicologia como ciência natural. 

     Canguilhem vai dizer que para se definir o que é a psicologia, será necessário fazer uma historiografia uma genealogia acerca do que se foi denominado psicologia ao lado da história. Canguilhem vai remeter seu pensamento aos gregos. Para os gregos a psicologia era o estudo da alma “psique”, mas os mesmos entendiam a alma como uma parte mais da anatomia, do corpo; aqui a psicologia seria uma ciência natural e isto implica que a psicologia é parte da natureza que está aí e que foi transformada em estudo. A psicologia tem uma implicação histórica e atual, porque se a “psique” esta presente em cada um dos seres, ela está encarnada. 

          Em suma, como psifisiologia e psicopatologia, a psicologia de hoje remonta ainda ao século II. (Canguilhem, 2012, p. 405). 

        Hoje a outros estudos e é conhecido como a neurociência, que é o estudo da alma “psique”. (observação minha).

           II - A psicologia como ciência da subjetividade

        Depois se tem o estudo da psicologia da subjetividade, que é a tentativa da compreensão da visão do sujeito no mundo. 

        A - A física do sentido externo

      A psicologia como ciência física do sentido externo, que é o estudo da percepção. Para o físico mecanicista, a percepção seria um descobrimento de que se dois sujeitos poderiam ver dois objetos e se depararem com dois dados diferentes e nenhum dos dois estarem enganados; há não ser que houvesse uma distorção que se introduziu no objeto assim como ele é observado. A descoberta é que os sentidos podem enganar-nos. A partir deste engano e deste descobrimento surgiram interesses de tentar entender como aparecem essas distorções; este estudo se passa pela compreensão de como o espírito nos enganam.

       B - A ciência do sentido interno

       A ciência do sentido interno, ou seja, o estudo do “eu”. Descartes diz que não é possível conhecer o mundo externo de forma direta e fiel. Porque se o espírito captasse o mesmo de maneira direta o mesmo teria a introspecção; por aqui aparece um pequeno debate entre Descartes e Aristóteles. Aristóteles dizia que a introspecção não era algo direto, ele via que o homem não se conhece a si mesmo de forma direta se não for através de reflexo que é desenvolvido pela natureza; o homem não pode ver a se mesmo a não ser pelo reflexo que a natureza desenvolve. Então o homem necessita da natureza para conhecer-se a si mesmo. O conhecimento de se mesmo é mediado pela natureza, mas Descartes protesta dizendo que a realidade não é logo o que é visível; o homem não se conhece a si mesmo se não tem o espírito em que seja possível captar a se mesmo de maneira direta. 

         C - A ciência do sentido intimo

         Tenta indagar questões que nos ocultam e ocultam a outros, e fala de Freud e de Bichat. Já não é possível centar-se em si mesmo se não é dito em um para-si; o homem não é um projeto terminado, mas que está construindo-se a todo o tempo. O homem não é um corpo terminado e sim ele é o que ele faz e como a todo o tempo ele esta fazendo algo ele projeta-se. 

          III - A psicologia como ciência das reações e do comportamento

        Canguilhem disserta sobre o homem em sua potencialidade enquanto a sua produtividade. Aqui a uma mudança do ponto de vista não somente na psicologia, mas na concepção antropológica. A concepção antropológica que faz a pergunta, quem é este homem? Então Canguilhem relata que se passa de um campo de utilitarismo a um instrumentalismo. Que passou a considerar o homem como o centro do universo, esta é uma visão “antropocêntrica” ao qual o homem é o centro e usa o que tem a seu alcance como ferramenta para lhe servir, colocando assim o homem em um lugar central. Já no instrumentalismo o homem é colocado como uma ferramenta a mais; e estudado como uma ferramenta de distintas maneiras, ou seja, vai sendo compreendido qual seria o lugar mais conveniente para ele, onde é mais conveniente ter uma pessoa trabalhando (funções laborias) onde vão ser ocupados os cargos de acordo com o seu perfil. 

    Canguilhem diz que há distintas versões de que o homem vem atravessando a história da psicologia e onde a mesma não é nem um pouco inocente nem casual e que há sempre um pressuposto e uma intenção por detrás. 

     No final Canguilhem diz que o filósofo pode orientar e aconselhar o psicólogo quanto a sua decisão: se ele deseja seguir ao Conservatório de alguns grandes homens ou se o mesmo deseja dirigir-se a Chefatura de polícia¹. 

[i]

¹ Sistema social baseado na autoridade e no estatuto mais elevado de alguém; normalmente um chefe.
(http://www.dicionarioinformal.com.br/significado/chefatura/2487/).


Referência:

    CANGUILHEM. G. Estudos de História e de Filosofia das Ciências, Rio de Janeiro. Forense Universitária. 2012, 1ª edição.

sábado, 16 de julho de 2016

O paradoxo: “Liberalismo sartriano” e o “Determinismo marxista”

INTRODUÇÃO:

Pensar o mundo como algo separado, distante, não intrínseco ao ser é colocar-se diametralmente em outro campo existencial, que perpassa uma alegoria gigantesca entre o aparente e o existente. O dialogo aqui presente entre Eu, "Sartre e Marx", engendra numa abordagem paradoxal entre a subjetividade-objetividade (pensada a partir de Schopenhauer), e a liberdade gratuita sartriana e a negação desta mesma liberdade a partir de Marx que coloca o ser como uma consciência determinada pelo social-capital.

A partir deste paradigma entre a saída das correntes existenciais e o determinismo marxista, encontra-se um enorme problema sobre as possibilidades e emaranhados que o acomete entre o assumir e o não assumir a responsabilidade onde a qual não será possível fugir ou tentar desviar-se da mesma, pois o mundo é esta imanência do aqui e agora.

No primeiro parágrafo, teremos uma dialética entre “O mundo e suas”, que tentará levantar questões imanentes e epistêmicas no que tange a existência humana e seus pressupostos epistemológicos; assim como o segundo “Será que sou alguma coisa ou sou o que fizeram de mim?”, vai tratar sobre a liberdade gratuita de Sartre e o determinismo de Marx, aonde para ele o homem é produto do meio.

I - INVESTIGAÇÃO:

O “MUNDO” E SUAS...

"E se um dia ou uma noite um demônio te seguisse em tua suprema solidão e te dissesse: "Esta vida, tal como a vives atualmente, tal como a viveste, vai ser necessário que a revivas mais uma vez e inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, pelo contrario. A menor dor e o menor prazer, o menor pensamento e o menor suspiro o que há de infinitamente grande e de infinitamente pequeno em tua vida retornar, e tudo retornará na mesma ordem - essa aranha também e esse luar entre as árvores, e esse instante e eu mesmo! A eterna ampulheta da vida será invertida sem cessar - e tu com ela, poeira das poeiras!". Não te jogarias no chão, rangendo os dentes e amaldiçoando esse demônio que assim falasse? Ou talvez já viveste um instante bastante prodigioso para lhe responder: "Tu és um deus e nunca ouvi coisa tão divina!" Se este pensamento te dominasse, tal como és, te transformaria talvez, mas te aniquilaria; a pergunta: "Queres isso ainda uma vez e um número incalculável de vezes?". Esta pergunta pesaria sobre todas as tuas ações com o peso mais pesado! E então, como te seria necessário amar a vida e a ti mesmo para não desejar mais outra coisa que essa suprema e eterna confirmação, esse eterno e supremo selo! (NIETZSCHE, 2008, p. 239-230).

Nietzsche remonta um paradoxo entre pensar em viver, deixar-se viver ou viver intensamente o aqui e agora. O filosofo nos adverte sobre o que fazemos de nossas vidas enquanto vividas, se somos vividos por ela ou se a aproveitamos a mesma em sua plenitude e sua potencialidade onírica.

O mundo são essas imanências, ou seja, o aqui e agora; que são sempre projeções, numa equivalência feita por hiatos que produz essas mesmas projeções, que entre emaranhados e possibilidades projetadas geram novas ações que tendem a uma perspectiva resultante de novas imanências, tendo como hegemonia o alcance dos princípios para uma tentativa de sair da obscuridade, dos muros, das barreiras criadas pela consciência e desenvolver esses “desdobramentos”, que é o principio de equivalência como poder desconstrutivo.

O mundo como subjetividade-objetividade tende a uma peculiaridade em sua organização; pois depende de fatores externos-internos-do-ser, que colocando-se na posição central, ou seja, no epicentro do corpúsculo de uma sociedade concreta, tendo sua realidade-como-existência-racional de um ser que sente-imagina-percebe a tudo e a todos, numa equidistância de um vácuo longínquo, tendo um antagonismo radical e que resiste ao processo sistemático, em que o modelo apresentado pelo social, deixou-e-ou-deixa-de-ser-o-melhor, aonde cabe ao expectador deslumbrar como um maestro da vida do outro e contemplar essas mazelas.

Os hiatos para o novo é como um “arado agrícola”, aonde é aberto sulcos na terra e projetado sementes e adubos para projeções futuras de ato-e-potência, no que se percebe como um projetar-se do solo firme e real ao possível e abstrato, tendo-se uma analogia entre a negação do não-ser, que foi o ser depois de projetar-se, ou seja, laçar-se em uma dimensão caótica e obscura, em uma atmosfera impactante-desconsertante que trás consigo angustia-medo-desespero, do real não conhecido e agressivo, feroz, veloz que espera em sua totalidade um ser em hiato, projeções, mas sua envoltura está caracterizada pela imanência, entendida como “o aqui e agora”. Este instante é um paradoxo de incertezas-inseguranças-rebeliões, para desdobrar-se em uma possibilidade de ser-algo-que-quer-ou-que-se-projeta, como um telescópio lunar, que a todos os ângulos em uma analítica geométrica não se retrai, mas que se percebe, se abre, se projeta e se desdobra para uma categoria ainda não conhecida que é este mundo ao qual ele vive-sonha-idealiza. Onde está este mundo? Será ele mesmo este mundo? Quais suas possibilidades e seus desdobramentos para tal?

II - INTERPRETAÇÃO:

SERÁ QUE SOU ALGUMA COISA OU SOU O QUE FIZERAM DE MIM?


“[...], lembramos ao homem que não há outro legislador senão ele mesmo, e que é no desamparo que ele decidirá por si mesmo; e porque mostramos que não é voltando-se para si mesmo, mas sempre buscando fora de si um fim que consiste nessa liberação, nesta realização particular, que o homem se realizará precisamente como humano.” (SARTRE, 2010, p.44).

O ser como protagonista de sua existência sente-se portador de uma categoria modular de vida, aonde é percebida como senhor, construtor, magnânimo de uma edificação existencial pragmática e delineada para uma atitude mitológica edificada por um saber paradoxal engendrado em emaranhados de padrões sociais, antropológicos, históricos e religiosos. Se esses modulares forem categoricamente exemplos para um constructo imanente então o ser não é totalmente livre? Ou é livre e através dos estímulos externos que prevalece?

Se o homem esta em um ambiente que aparentemente não é propicio ao seu e ele subentende que ali equivale a algo interiormente a uma motivação interior individualizada, é analogamente pensar que “seu ser não estava prevalecendo desta maneira por estimulo reprimido”; então a abrangência de sua decisão parcial para a aquisição desta atitude não é tão surpreendente para o mesmo, que a deliberação desta atitude não passa de uma liberação de sua própria existência reprimida.

Bom se o homem não é o seu ser construído a partir dele mesmo ou através de modulares, exemplos e ao mesmo tempo tendo a possibilidade de desconstruir este mesmo paradigma exemplificado pela sociedade, família etc., então ele pode ser uma maquina construída ou reconstruída pela mesma cultura antropológica, histórica, sociológica e filosófica.

O determinismo do filosofo Karl Marx diz: “Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrario, o seu ser social que determina a sua consciência”. (MARX, 1977, p.23). Sartre nos adverte: “[...], todo homem que se refugia por trás da desculpa de suas paixões, todo homem que inventa um determinismo, é um homem de má-fé”. (SARTRE, 2010, p. 39). Se a consciência do social determina a consciência do individual, o ser esta quase que totalmente anulado, pois a sua existência é aniquilada a partir desta negação, como um ser que não mais escolhe, decide por si mesmo, etc. “[...], não existe determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade. [...], o homem está condenado a ser livre”. (SARTRE, 2010, p.24).

Visão determinista:

Para os deterministas este conceito é aparentemente gratuito, sem paradigmas e redundâncias. O determinismo refere-se à ideia de que nada pode acontecer que não tenha uma causa e à crença num sistema composto todo ele por relações causais. Assim, trata-se de uma atitude que crê que o observador pode ser omnisciente e prever resultados a partir do conhecimento de dados preexistentes que assume como causas do que quer estudar.

“Na Sociologia, a adoção de pontos de vista deterministas significaria aceitar que o conhecimento das estruturas sociais atuais permitiria prever com toda a exatidão os sistemas sociais do futuro. O determinismo não teve influência notória na Sociologia, mas alguns sociólogos das primeiras gerações tomaram uma atitude determinista relativamente ao pensamento de Karl Marx, quando assumiram que a diferenciação social em classes e o conflito entre elas é originado por fatores econômicos e que o sistema político resulta direta e exclusivamente dessa diferenciação social.” http://www.infopedia.pt/determinismo-(sociologia).

Pode-se definir o determinismo como sendo:

A doutrina ou a teoria que afirma que todos os fenômenos ou acontecimentos estão determinados por algum motivo. Isto implica entender a realidade como a consequência direta de uma causa.

Pode-se aplicar a ideia de determinismo em diversos âmbitos. Na biologia, a ideia de determinismo refere-se à explicação da conduta dos organismos vivos segundo as características dos seus genes. Isto significa que os seres humanos e os animais atuam de acordo com a sua adaptação evolutiva e ao que dita a genética.

O determinismo biológico, em última instância, supõe que as pessoas não são livres, uma vez que se comportam segundo características inatas e hereditárias. Por conseguinte, há indivíduos que teriam comportamentos reprováveis não podendo ser alterados ainda que a sociedade se esforce pela sua readaptação.

No contexto da religião, o determinismo afirma que as ações das pessoas são determinadas pela vontade de Deus. As pessoas não podem atuar de acordo com o livre arbítrio, pois estão sujeitos à predestinação.

A nível econômico, por fim, o determinismo tem por base a crença que a sociedade evolui segundo as condições econômicas. Qualquer estrutura ou sistema depende da propriedade dos meios de produção e das características das forças produtivas.

O determinismo econômico pode apreciar-se no marxismo, que divide a estrutura social numa superestrutura (formada pela política, pela ideologia, pela legislação, etc.) e numa infraestrutura (as condições materiais e econômicas) que a determina.  http://conceito.de/determinismo#ixzz45fL4utfS.

Karl Marx é interpretado como “determinista”. Essa assunção encontra justificativa em dois aspectos de sua obra: (a) porque ele entende que a sociedade ruma ao fim do capitalismo, fatalisticamente; e (b) porque ele visualiza o indivíduo sendo determinado pela estrutura social. Para Marx, o todo teria primazia para explicar a parte, indo de encontro ao individualismo metodológico, com uma relação causal inversa, na qual a parte explica o todo.

Um ponto crucial na crítica a Marx é a assunção de que o indivíduo é um reflexo de sua condição material tão somente. Embora haja movimento, mudança no homem, é a própria natureza que o empurra e o movimenta, autodeterminadamente, levando-o a um objetivo final. A vida social seria, portanto, unideterminada em Marx. Apenas o modo de produção e sua consequente luta de classes ditariam o arranjo social e o comportamento do indivíduo.

Visão liberalista:

O determinismo ganhou muita força com o racionalismo do século XVII: nele o homem já nascia com uma essência pré-estabelecida (inatismo e/ou essencialismo). Isso significa que o homem realizaria uma ideia anterior a sua própria existência no mundo, concretizando uma natureza concebida anteriormente por um intelecto divino. O ser humano teria, assim, uma essência a cumprir: estipulada não por ele, mas por um Ser maior.

A grande querela do existencialismo contra o determinismo no que diz respeito à liberdade humana é a afirmação de que “a existência precede a essência” (SARTRE, 2010, p.18); subvertendo, assim, a tradicional formulação de que “a essência precede a existência”.

Para Sartre, não há um Deus que produza uma essência humana. O homem não se constitui como um objeto qualquer, apesar de estar determinado pelas mesmas leis da física que os demais corpos. O homem esta em outro campo que é o da consciência.

Na obra “O Ser e o Nada”, Sartre define o “Ser” de “em-si” e o “Nada” de “para-si”.
O Ser é conceituado como em-si: “Que ele é, ele é o que ele é, mais nada. Ele é pleno, total, perfeito, ilimitado, nada pode perturbá-lo, pois ele não tem a menor consciência de si mesmo; ele é, pura e simplesmente.” (Curso de filosofia, 2012, p. 234). “O ser se define pelo principio de identidade: ele é o que é.” (Curso de filosofia, 2012, p. 235).  

O Nada é conceituado como para-si: “A consciência, ao contrario, não é idêntica consigo mesma, toda busca de autoidentificação devolve-a imediatamente ao outro que não ela mesma: para ser deve ser consciência de algo. A consciência só se deixa definir pelo principio de contradição: ela é o que não é e não é o que é.” (Curso de filosofia, 2102, p. 234).

A consciência é uma constante recusa de ser objeto. Isso significa que ela é recusa de ser essência, um constante preencher-se de conteúdo exterior a ela (conteúdo que corresponde aos objetos com essências dadas – objetos que Sartre chamará de seres em-si). A consciência não tem uma essência prévia, sendo somente consciência de algo que está fora dela mesma. Compreende-se, então, a afirmação sartreana de que “a existência precede a essência”: somente na existência é que há essa possibilidade de encontrar objetos que são o que são. Fora disso a consciência (do homem) nada é.
 “O homem é o ser pelo qual o nada vem ao mundo”
(O ser e o nada, p.60, In: Curso de filosofia, 2012, p. 235).

E em contrapartida Sartre critica Karl Marx em sua obra “Critica da razão dialética”; aonde ele escreve:

“No momento em que a pesquisa marxista assumir a dimensão humana (isto é, o projeto existencial) como o fundamento do Saber antropológico, o existencialismo não terá mais razão de ser: absorvido, excedido e conservado pelo movimento totalizante da filosofia, ele cessará de ser uma pesquisa particular para tornar-se o fundamento de toda pesquisa.” (Critica da razão dialética, p. 111, In: Curso de filosofia, 2012, p. 241).

CONCLUSÃO:

Este artigo tem como propósito fazer uma observação no que tange a tomada de decisão quanto à própria existência do ser com a proposta nietzschiano, a liberdade gratuita do individuo no modelo sartriano dentro de um antagonismo determinista de Karl Marx. Para Sartre não há determinismo o ser é livre em sua plenitude como um ser existente e todo homem que se refugia por trás de suas desculpas e suas paixões é um homem de má-fé, pois o ser é responsável não somente por ele mesmo, mas está responsabilidade abarca a todos, pois, ao escolher o homem ele escolhe a si próprio e isto envolve todo um engajamento; para Marx isso se inverte, pois, o ser não é livre onde a sua consciência para poder ter a opção de decidir já está determinada pelo complexo estrutural construído pela superestrutura e pela infraestrutura edificada em uma sociedade capitalista. Na perspectiva de Nietzsche ele perguntaria se desejaríamos reviver nossa vida por diversas vezes da forma como a vivemos ou como fomos vividos por ela...
Este aporte antagônico levantou uma prospecção epistemológica e ontológica do ser não como coisa, objeto de instituições ou de historicidade, mas como um ser livre em sua plenitude ou se com um olhar marxista um ser não livre e aonde a pergunta nietzscheana de viver ou ser vivido, levanta a contemporaneidade uma reflexão delicada da existência de cada um. 

REFERÊNCIAS:
MARX. K. “Prefácio de Contribuição à crítica da economia política”. São Paulo, Martins Fontes, 1977.
NIETZSCHE. F. A Gaia Ciência. São Paulo, Escala, 2008.
SARTRE. J. P. O existencialismo é um humanismo. São Paulo, Vozes, 2010.
REZENDE. A. Curso de filosofia. Rio de Janeiro, Zahar, 2012.

CONSULTA:

REALI. G. História da filosofia. vol. III, São Paulo: Paulus 2007, 8ª edição.

A complexidade existencial é um absurdo

INTRODUÇÃO

Aqui a abordagem sobre a problemática entre a complexidade e o absurdo, foi um tema desenvolvido a partir de uma inquietação sobre a existência do ser na contemporaneidade; em seguida com o contato da obra do Filosofo francês Albert Camus, me vejo não mais sozinho nesta especulação inquietante sobre o tema proposto. A abordagem tem forte reflexão metafísica e paradoxos existenciais e ontológicos, que envolvem uma linguagem perplexa de paradigmas desconcertantes e que inquiridos em uma busca sobre uma resposta aproximada sobre, implica e acarreta uma proposta de acalento espiritual.

A perplexidade se dá muitas vezes na calorosa busca de respostas e  desencontros entre o ser e o aparecer. Empenhado em resultados não obtidos em sua caminhada pelo entendimento o ser só pode ter algo a qual ele busca se for perguntado ao seu próprio “eu”, que como um juiz deve questionar e ter a resposta dentro de si mesmo e não correr ou correlacionar esta interrogação em seu exterior, que só irá dar-lhe resposta apaixonantes e desejosas ao que o seu “eu” busca ouvir como um soneto suavizado entre o espectador e o maestro.

E se perguntar-mo-nos, quem será o maestro e o espectador de nossa própria vida?

“Só existe um problema filosófico realmente sério: é o suicídio. Julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida é responder à questão fundamental da filosofia. O resto, se o mundo tem três dimensões, se o espírito tem nove ou doze categorias, aparece em seguida. São jogos.” (CAMUS, 1942, p. 7).

A COMPLEXIDADE

O ser tende a uma perplexidade com o outro, ou seja, com as coisas exteriores seja ele um outro ser (que pensa), um objeto (uma coisa) e a tendência a esquecer-se de si mesmo parece demasiado suave. Delineando as aparências da existência o curso é aparente entre o não enfrentamento do real para uma observância da coisa, seja ela a natureza, os objetos, etc.

A obviedade da complexidade a partir da clareza súbita na mente, aonde o que é visto e sentido é um absurdo, e a complexidade do todo passa a ser intencionalmente uma canalização a inobservância das essências. 

Não obstante a clarividência no desvelamento como um véu que se rasga diante da perplexidade da liberação entre o real e o aparente, se constrói pela capacidade de uma amnésia intencional, entre a derrubada do edifício construído e a permanência do mesmo, tendo em vista sua projeção em não relatar a refutação sobre a gnose que mostra a imagem ao espectador ludibriado pela sua própria consciência em tentar entender em partes todo o universo ao qual ele esta inserido. 

O ludibriamento diante da consciência encarrilhado de um fenômeno ao qual lhe aparece, é captado com uma tentativa iminente da não constatação do que é percebido. Isto implica questionamentos diante da capacidade do ser consciente diante de uma coisa e/ou diante de sua própria percepção, sensação e imaginação, como um leque emaranhado de possibilidades quanto a um ditame de envergadura existencial.

Parece que se a não observância do real perante o imaginário, tende a ser uma leve e sucinta demência conscienciosa, a qual uma teia esta bem tecida e preparada para a sua habitação, complacente e harmoniosa, com uma duvida, ou uma culpa, ou um ressentimento, etc. E se a obscuridade esta pronta para a ação imediatizada por conta da não aceitação da realidade, que pode ser como uma estatua feita de concreto, com uma estrutura chumbada e bem firme, esta rigidez parece ser mais que um observatório abstrato e sim um problema reprimido, que se encontra em um baú metalizado à sete chaves, aonde as chaves podem está no sepulcro existencial.

Se até o momento o ser está na retaguarda diante de um problema sistêmico que pode ser social-psicológico-teológico-político-cientifico; a válvula de escape pode ser o enfrentamento das causas que o acomete diante de uma crise existencial perplexa e de uma complexidade paradoxal, aonde os paradigmas tendem a se fortalecer, se não for derrubado o muro existencial construído pelo ser que se encontra patologicamente infeliz ao qual a sua crise é um mal-estar, a totalidade desta jaula cultural, tende a fazer o outro obedecer permanentemente como um animal adestrado que recebendo todos os comandos, não tem consciência, nem potência para radicalizar o processo estruturador ao qual somente através das “micro” ações, é possível atomizar uma sociedade em constructo e potencializa-la para uma tomada de decisão.

O ABSURDO

Fazer um movimento da observância do “Eu” e do “Não-Eu”, torna a vida mais maleável para uma caracterização de uma existência entre o encorajamento e o comprometimento com a vida vivida. Este paradoxo tende para uma saída aonde o acaso do “Eu” mesmo subtraindo as perspectivas objetivadas pelo próprio - delimitando um horizonte cheio de possibilidades a qual a supra necessidade de organização do que sou e do que devo ser ou posso vir a ser, esta embasada numa ousadia entre ser e aparecer.

A obviedade do absurdo é a sua complexidade a partir do “insight”, o ser se deparará com uma inautenticidade a partir de sua própria existência pendular, sendo inalterada como uma espécie de ampulheta da sorte no espaço-tempo, em que a transitoriedade encontra-se como em uma tragédia épica dos tempos homéricos.

Coagulando esta problemática, o enrijecimento entre os paradigmas e os paradoxos, alentados numa categoria metabolizada de aceitabilidade, exatidão e engajamento com esta ascensão ao nada é própria da fragilidade e desistência do não engajamento a uma perspectiva de adentrar no panorama de autenticidade, construindo sua identidade categórica do ser como existente que é sua autoafirmação, através de processo de metamorfose sendo desejado em um conjunto, aonde toda a estrutura esta sendo edificada para a sua obviedade humana.

O que será então esta obviedade humana? Enfrentamento? Autoafirmação? Encorajamento? Ou, aceitabilidade para uma vida “normal” atomizada por todas as instancias e instituições? Pode-se pensar num todo, em que esse todo possa ser analisado no singular, ou, sempre é necessário pensar no plural? A liquefação é interessante como construção do ser, ou a solidificação, ou seja, a “massificação” tende a uma estrutura mais interessante?

“A VIDA É COMO UMA ESCOLA...”

Observar, tentar entender, discernir, aprender e empreender uma vida a qual a existência do ser esta inserida na mesma é como que estas observâncias que estão no senso comum, como é dito: ”A vida é uma escola”. E se a vida é uma escola e o ser não se interessa pelas aulas e o professor (a vida) empenha-se tanto em mostrar-lhe como é, como se deve, como é possível, etc. É mostrado então que este mesmo aluno é relapso e desinteressado em apreender as lições que tanto lhes são ensinados, com uma apresentação não muito coerente, em muitas vezes ela envereda pela violenta, agressividade, decepções, loucura, demência, etc; e por outro lado lhe é mostrado o paradoxo dela mesma que são os carinhos, a delicadeza, a paciência, beneficência, etc; porém tendo em sua maior relevância a estilização da complexidade e do absurdo.

“O absurdo é inefável, pois se houvesse uma forma de explicá-lo logicamente deixaria de ser absurdo. Não é um conceito abstrato, mas uma experiência vivida pelo humano em seu cotidiano. O homem pertence ao tempo e este, por sua vez, é o seu amigo e o seu inimigo. A contradição está presente quando planejamos o amanhã ou quando somos “surpreendidos” pela morte. Não há possibilidade de separar o absurdo do nascimento da lucidez, pois a consciência da inocência de um olhar é capaz de captar o absurdo, ou seja, de fazer emergir o desejo por unidade e explicação para os questionamentos trazidos pela clareza da razão. O homem então passa a compreender o absurdo como algo único e inapreensível, assim esbarra com os “muros absurdos” que o circundam. É nessa busca por compreensão que ele sempre encontra o incompreensível. Segundo Camus (1942, p. 26-27): esse inapreensível sentimento do absurdo, quem sabe então possamos atingi-los nos mundos diferentes, porém irmanados, da inteligência, da arte de viver ou da arte pura e simples. O ambiente de absurdo está desde o começo. O final é o universo absurdo e a atitude de espírito que ilumina o mundo com uma luz que lhe é própria, para fazer resplandecer o rosto privilegiado e implacável que ela sabe reconhecer-lhe.

CONCLUSÃO

Este artigo levanta um questionamento e têm como propósito fazer uma analise entre os conceitos de “complexidade e de absurdo”.

 “A partir do meu olhar e com a leitura da obra “O Mito de Sísifo” do Filosofo francês Albert Camus, a absurdidade existencial do ser em sua plenitude implica uma complexidade entre o essencial e o necessário.”

Camus nos diz: “Julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida é responder à questão fundamental da filosofia”; e é nesta proposta filosófica que a tese abordada tentou desdobrar sucintamente uma caracterização inicial da sua filosofia. A complexidade e o absurdo foram analisados aqui como um problema existencial na contemporaneidade.

REFERÊNCIA


CAMUS. A. O mito de Sísifo. Rio de Janeiro: Guanabara, 1942.

Transvaloração dos valores - perspectiva nietzscheana

INTRODUÇÃO  

“Não sou de modo algum, por exemplo, um espantalho, um monstro moral – sou inclusive por natureza a antítese da espécie de homem que, até o presente, foi venerada como virtuosa. Dito entre nós parece-me que justamente é para mim questão de honra. Sou um discípulo de Dionísio, preferiria ser um sátiro que um santo”.
(Nietzsche, Prólogo 2, p. 15-6, Ecce homo).

A tradição filosófica veio no percurso de sua historia desenvolvendo um pensamento remetido ao puro racionalismo, colocando o sujeito como o centro e o meio do seu “eu”, alter ego (MARTINS, 2006, p.317).

O homem é um ser histórico e social, que necessita de uma relação amistosa com o outro para uma possibilidade de interação, integração e vivenciamento em uma sociedade repleta de artifícios, caricaturas, simulações e dissimulações individuais e coletivas.

Nesta perspectiva se instaura uma cultura onde os homens dão significados às coisas da natureza e às suas relações, criando regras e normas para guiar suas ações em uma comunidade. É neste contexto que a moral é instaurada como condição de gerir os indivíduos em grupos, pensando e agindo dentro da mesma perspectiva. Os hábitos são implantados e na repetição dos mesmos são apreendidos inconscientemente e levam todos a praticar ações em tais situações habituais tornando-se um costume. Em Humano, demasiado humano, Nietzsche escreve:

Uma importante variedade do prazer e, com isso, fonte da moralidade, provém do hábito. O habitual é feito mais facilmente, melhor, portanto, com mais agrado, sente-se nisso um prazer e dabate-se por experiência que o habitual deu bom resultado, que tem, portanto, uma utilidade; um costume com o qual se pode viver está provado que é salutares proveitosas, ao contrário de todas as tentativas novas, ainda não comprovadas. O costume é, por conseguinte, a união do agradável e do útil; além disso, não exige nenhuma reflexão. Assim que o homem pode exercer coação, a exerce para conservar e propagar seus costumes, pois para ele são a sabedoria garantida.
De igual modo, uma comunidade de indivíduos obriga cada elemento isolado ao mesmo costume. Esta é uma conclusão errada: porque alguém se sente bem com um costume, pelo menos, porque por intermédio do mesmo assegura sua existência, então esse costume é necessário, pois passa por ser a única possibilidade de alguém conseguir se sentir bem; o bem-estar da vida parece provir exclusivamente dele. Esta concepção do habitual como condição de estância é aplicada até nos menores detalhes do costume: como a compreensão da verdadeira causalidade é muito reduzida entre os povos e as civilizações de nível menos elevado, aspira-se com um temor supersticioso para que tudo continue a seguir o mesmo passo; mesmo quando o costume é difícil, austero, oneroso, é conservado em vista de sua utilidade superior aparente.
Não se sabe que o mesmo grau de bem-estar também pode existir com outros costumes e que até é possível atingir graus mais elevados. Mas aquilo que se percebe bem é que todos os costumes, até os mais austeros, se tornam com o tempo mais agradáveis e mais suaves e que até o modo de vida mais severo pode se tornar um hábito e, portanto, um prazer. (NIETZSCHE, 2008, p. 96)

Nietzsche faz uma critica sobre a forma de vivenciar a moral desta maneira; uma moral não refletida leva o sujeito a sucumbir e exaurir ao fracasso, pois, o mesmo não ultrapassa esta possibilidade de transvalorar estes hábitos inconscientes e continua na mediocridade. Deve-se decidir e julgar quais os valores morais são necessários para guiar cada ação. Avaliar o que é moral ou imoral, isto é um exercício de uma reflexão ética. Transvaloração dos valores é:

Transvaloração dos valores: significa uma troca do valor e dos valores originais, é dizer, uma troca do sentido entre o “bem” ou “mal”, de acordo com um determinado modo de valorizar a vida (ativo ou reativo).

 História da transvaloração moral (“Genealogia da moral”) Platonismo-judaísmo-cristianismo: se inverteram as origens dos valores da vida (simbolizados na tensão entre Apolo/Dionísio), por valores da decadência segundo o seguinte esquema: 


Moral originaria: o referencial                                              Moral decadente: o referencial da valorização  para   a                valorização é a energia vital                                                                    os conceitos de culpa e pecado

                 BOM= forte, feliz                      Ativo                         MAL= pecador, impuro

                RUIM= fraco, enfermo             Reativo                      BOM= piedoso, dócil


Causa da transvaloração: o ressentimento e a má consciência do sacerdote por sua debilidade diante da vida. É Sublinhado este defeito ou animação em um desejo de transcendência e uma entrega a Deus: a vida ascética como forma de autotortura, de redenção e de culpa.


Levantada essa problemática adentra-se no campo ético. Onde a ética tem como objetivo a reflexão dos valores morais. Onde esses valores são históricos e mutáveis, onde cada cultura tem os seus próprios valores morais num determinado tempo histórico.

AXIOLOGIA E EDUCAÇÃO

As avaliações dos comportamentos individuais e coletivos geram juízos de valor: O que é bom ou mau? O que é moral ou imoral? Como esses valores são construídos, ensinados e/ou transformados? Qual foi o tipo de cultura moral que o ocidente priorizou e/ou utilizou nos últimos séculos? O que prevalece hoje será uma moral racionalista, cristã, kantiana, relativa ou uma ética que rejeita a razão absoluta?

PERÍODO ÁNTIGO

Intelectualismo socrático; Platão e Aristóteles seguem a mesma linha de pensamento, porém cada um a seu modo de refletir sobre; onde o sujeito ético deveria seguir somente a sua consciência, em busca do Bem e da Felicidade.

IDADE MÉDIA

Na Idade Média, seu objeto modifica pela perspectiva do advento do movimento cristão, ou seja, o Cristianismo. Agostinho de Hipona utiliza-se da filosofia platônica para fundamentar seus conceitos de elevação até Deus, ou seja, o amor. Tomás de Aquino utiliza-se da filosofia aristotélica para afirmar o conceito de que Deus é o fim supremo para alcançar a felicidade;

O cristianismo fundamenta o livre arbítrio, porém divide o bem (Deus) e o mal (demônio), onde o caminho para a ética são os desígnios de Deus por meio da lei divina revelada. Em seguida o cristianismo introduz a ideia de moral, como “dever”, onde o sujeito deve cumprir a lei de Deus e cumpri-la sem exitar em nada a ordem desta entidade. É um ato de dever.

MODERNA E CONTEMPORÂNEA

Rousseau diz que, o homem é puro e bom, e que esta essência é inata a cada sujeito. O mesmo se corrompe com o tempo em uma sociedade perplexa somente nas mazelas da vida.

Em Kant a ética é “razão prática”, com o objetivo de normas e fins éticos. O “dever” não é uma imposição externa, mas sim, uma imposição interna; uma lei moral que existe em nós mesmos. Obedecer a esse dever é obedecer a si mesmo. Para Kant o homem deve agir em respeito ao dever e obedecer sempre a sua consciência. É o imperativo categórico, uma lei moral interior.

Posterior a Kant, combatendo o formalismo e o universalismo e valorizando o homem concreto, social e histórico em uma sociedade contraditória e dividida em classes, encontra-se Marx que afirma que a moral cumpre um papel social e que numa mesma sociedade podem existir diversas concepções morais; com isso a moral não é absoluta, podendo ser relativa.

A ética contemporânea questiona o racionalismo e vem reconhecendo a parte irracional e inconsciente dos comportamentos de cada indivíduo ou em comunidade. A historiografia filosófica considera o começo da filosofia grega a partir de Sócrates e pensa a anterior como momento preparatório.  Nietzsche refutou o racionalismo ético socrático: para ele a filosofia é a pré-socrática. A alegria do devir é própria desses filósofos. Nietzsche aponta para a importância da emoção, do desejo e da vontade como fundamento para a edificação de uma nova moral, ou seja, a transvaloração dos valores existentes. 

No primeiro tratado “Bem e Mal” – “Bom e Mau” de Genealogia da moral, Nietzsche tratou de uma verificação genealógica dos valores, tendo como objeto de pesquisa os jogos de força entre o forte e o fraco, entre o aristocrata e o escravo.  

“A rebelião dos escravos na moral começa com o fato que o próprio ressentimento se torna criador e gera valores; o ressentimento desses seres, aos quais a verdadeira reação, aquela da ação, é interdita e que não se contenta senão com uma vingança imaginária. Enquanto toda a moral aristocrática nasce de uma triunfante afirmação de si mesma, a moral dos escravos opõe a um “não” a tudo o que não é seu, a um de outro modo, a um não ele mesmo; esse “não” é seu ato criador.” (10, p. 40, Genealogia da moral).

Dentro deste arcabouço e miscelâneas de conceitos filosóficos, a instituição escolar adentra neste campo emblemático e problemático em que o horizonte estrito que perpassa a educação encontra-se o processo educativo com muitas influências morais racionalistas, embasadas na perspectiva cristã e kantiana, pautando somente a razão como controladora.

Com o fim do monopólio da Igreja cristã sobre a educação em meados do século XVIII, aparece o movimento iluminista com a “garantia” de uma libertação do sujeito através das luzes, retirando o homem das trevas.  Mas a educação hoje no século XXI ainda não se libertou totalmente dos valores cristãos utilizados e implantados pelas instituições educativas. Exemplo:  O educador/professor é colocado como um sacerdote da educação, que poderá mudar o rumo da vida dos estudantes. Onde entra a pergunta: é possível mudar o curso da vida dos estudantes? O educador/professor é um deus, e/ou um sacerdote da educação?

O educador/professor deve ser facilitador/intermediador de idéias e possibilidades diante dos estudantes como construtor de conceitos de transformação educacional para elencar e levar a cada sujeito a transvalorar os valores existenciais e inquietantes na luta interior.

Os pilares do processo educacional é o trabalho das concepções morais. Observada a moral em uma perspectiva de controle e/ou autocontrole externo e/ou interno, como hábitos inseridos para um bom convívio entre todos e para todos, ela também pode ser pensada a partir e com Nietzsche de uma moral sendo uma mentira forjada para criar formas de subjugar o outro, de domesticar, adestrar, controlar, para enganar a si mesmo, negando-se os desejos, as emoções e as paixões.

Nietzsche fala do superanimal:

“A fera em nós precisa ser enganada; a moral é uma mentira forjada, para que não sejamos dilacerados por ela. Sem os erros que se encontra nos dados da moral, o homem teria permanecido animal. Assim, porém, se tornou por algo superior e se impôs leis mais severas. É por isso que odeia os segmentos que permaneceram mais próximos da animalidade: é por essa razão que precisa explicar o antigo desprezo pelo escravo, um ainda não-homem, uma coisa.” (40, p. 68, Humano, demasiado humano).

Pensar os valores a partir de Nietzsche, remete a uma reflexão de uma ética para a educação como possibilidade profunda no processo educacional. Na analise aqui abordada sobre a racionalidade ética, ela trás um distanciamento entre a escola e o estudante.
Primeiro, pela determinação de regras e normas impostas pela escola para com o estudante, aonde os mesmos devem internalizar comportamentos padronizados; Segundo, estes mecanismos retiram do estudante o prazer de estar na escola, e o mesmo tem que a todo o instante precarizar, anular os seus desejos, emoções e paixões. 

A crítica nietzschiana quanto a este tipo de educação, observadamente pautada em uma racionalidade em que o dever esta acima de tudo e de todos serviu para reprimir e não para garantir o exercício da liberdade, como aquilo que era espontâneo e natural nos indivíduos tornando-se vício e falta.
Nietzsche deixa uma constatação na obra Além do bem e do mal quanto aos desejos:

“Amamos, em definitivo, somente nossos desejos e não aquilo a que nós desejamos.” (175, p. 94, Além do bem e do mal).

TRANSFORMAÇÃO E EDUCAÇÃO

A história de uma sociedade enraizada através deste modelo de moral não é incomum, ela simboliza o processo de educação em que o principio controlador inibe o poder de criação e imaginação de cada um dos sujeitos.

Nietzsche traz uma abordagem em que este modelo implementado no processo educacional edifica uma moral com o sentimento de ressentimento, fundamentada no medo e no ódio. Este mesmo ser pode não desenvolver o esperado pelos educadores, pela sociedade e pelo Estado, porque a ineficácia no processo educacional pode trazer transtornos e ressentimentos memoráveis em cada sujeito engendrado nesta proposta elencada. Nietzsche trata dos ideais ascéticos (sacerdotes), sujeitos ressentidos por sua fraqueza de espírito; eles idealizam uma vontade doentia de representar superioridade sobre o outro, seus desejos de descobrir a forma que leva a dominação; não aceitação em confessar o ódio como ódio, tentam representar isso como justo, prudente, amistoso, ou seja, uma ambição de seres “inferiores”. (14, Genealogia da moral).

Na possibilidade do sujeito tentar contar com a sorte, depositar suas forças no outro, ou pensar por si só como uma ponte e não como um pensar futurista, ou seja, como meta a ser buscada, alcançada para se prospectar uma vida; o próprio sujeito relata e engendra em outra característica existencial no aqui e agora uma passagem do não-ser ao ser, ou seja, do vir-a-ser que é o próprio devir heráclitiano, nesta perspectiva ele é sua própria ponte, ele é sua própria passagem e, construindo suas pontes existenciais para a completude de sua vida, como auto-superação. Nietzsche em seu Zaratustra, através do funâmbulo na corda bamba: a cada passo ele usa o próprio desequilíbrio para se reequilibrar, ou seja, ele se restabelece pelo seu próprio desequilíbrio chegando ao equilíbrio, e se esse funâmbulo for interrompido, ele cairá. O próprio ser é para Nietzsche o senhor de sua autoconstrução e nesta luta entre medida e desmedida instintiva o sujeito tenta superar-se a si mesmo através das crenças educacionais,religiosas e morais.

“(...) O homem é uma corda estendida entre o animal e o ubermensch. Uma corda sobre o abismo. Perigosa para percorrê-la, é perigosa ir por esse caminho, perigoso tremer e parar. O que é grande no homem é ele ser uma ponte e não uma meta. (...)”. (Prólogo IV, p. 24, Assim falava Zaratustra, 2008).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na visão nietzschiana a educação não somente é um processo de criação, mas de libertação aonde a transformação do sujeito pressupõe a formação educacional. A transformação do ser é anterior a uma construção educativa, pois o sujeito somente pode ser um ser em transformação pelo próprio processo de transformação individual, ou seja, uma auto-superação como auto-afirmação da vida.
A educação pensada através de Nietzsche é uma formação existencial do aqui e agora, uma transformação no ser que já se é, e que a transvaloração diante de todas as possibilidades existentes tende a superar a si mesmo, dentro do ambiente ao qual vivência a sua construção ideológica. A crítica nietzschiana não promete nenhuma mudança, mas uma analise dos valores existentes e aponta-os:
“A última coisa que eu pretenderia seria “melhorar” a humanidade. Não estabeleço ídolos novos; os antigos vão aprender o que significa ter pés de barro. Derrubar ídolos (ideais) isso sim faz parte de meu ofício.” (Prólogo 2, p.16, Ecce homo).

REFERÊNCIAS

NIETZSCHE. F. A genealogia da moral. São Paulo: Escala 2009. 3ª edição.
NIETZSCHE. F. Além do bem e do mal. São Paulo: Escala 2011. 3ª edição.
NIETZSCHE. F. Assim falava Zaratustra. São Paulo: Escala 2008. 3ª edição.
NIETZSCHE. F. Aurora. São Paulo: Escala 2008. 2ª edição.
NIETZSCHE. F. Ecce Homo. São Paulo: Escala 2009. 2ª edição.
REALI. G. História da filosofia. vol. 1, São Paulo: Paulus 2011, 4ª edição.
REALI. G. História da filosofia. vol. 2, São Paulo: Paulus 2011, 4ª edição.
REALI. G. História da filosofia. vol. III, São Paulo: Paulus 2007, 8ª edição.
NIETZSCHE. F. Humano, demasiado humano. São Paulo: Escala 2008. 2ª edição.
ROUSSEAU. J. J. O contrato social. São Paulo: Hunter 2014. 1ª edição.
KANT. I. A metafísica dos costumes. São Paulo: Edipro 2008. 2ª edição
FEITOSA. C; BARRENECHEA. M.A; PINHEIRO. P. Nietzsche e os gregos: arte, memória e educação. Rio de Janeiro: DP&A 2006. 1ªedição.

JUNIOR. O. G. Nietzsche X Kant, Uma disputa permanente a respeito da liberdade, autonomia e dever. São Paulo. Casa do Saber. 2012, 1ª edição.